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domingo, 23 de setembro de 2012

Fraude em documentos escondia trabalho escravo no interior de São Paulo

Fraude em documentos escondia trabalho escravo no interior de São Paulo

Fiscalização em propriedade em Pirassununga (SP) libertou 26 trabalhadores em condições análogas à de escravidão. Eles foram aliciados em Minas Gerais e trabalhavam há cinco meses sem receber
Sem receber salários e impedidos de deixar a propriedade, um grupo de 26 trabalhadores, inclusive três adolescentes com menos de 18 anos, foi resgatado de condições análogas à escravidão em Pirassununga (SP), no Sítio São José. Eles aplicavam agrotóxicos e colhiam tomates na propriedade.
Os empregadores Shigueo Hayata e seus filhos André e Hélio Hayata fraudaram documentos trabalhistas, como exames médicos, recibos salariais e o registro na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) dos funcionários, de acordo com o procurador do Trabalho da 15ª Região, Nei Messias Vieira.
Os empregados estavam no sítio desde abril com suas famílias, sem receber salário. Somente o "cabeça da turma", espécie de gerente dos trabalhadores, era quem recebia um cheque mensal, no valor de R$ 1,3 mil, para comprar alimentos de um mercado que pertencia a Nelson de Souza, conhecido como “Nelson do Mercado” e candidato a vereador de Pirassununga pelo PP.
De acordo com o procurador do Trabalho, Nelson também é proprietário do sítio onde os trabalhadores foram resgatados. O local foi arrendado pela família Shigueo. A Repórter Brasil checou no Tribunal Superior Eleitoral e o imóvel não consta na declaração de bens do candidato.
O resgate aconteceu no dia 5 de setembro, em uma fiscalização do Grupo Móvel Rural do Estado de São Paulo, composto por equipes do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e do Ministério Público do Trabalho (MPT), motivada por uma denúncia à Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região (PRT-15). "Nós aproveitamos que já estavam previstas fiscalizações na cultura do tomate e apuramos a denúncia", diz o procurador do Trabalho.
Irregularidades trabalhistas já haviam sido descobertas em outras plantações da família Hayata. "Em Ribeirão Preto, ele [Shigueo] já havia assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC)", informa Nei. Na mesma fiscalização, agentes encontraram irregularidades em outra propriedade sob responsabilidade de Hélio Hayata, em Conchal (SP): empregados da fazenda foram encontrados sem carteira assinada e sem equipamentos de proteção para a aplicação de herbicidas.

Falsificação de documentos
As Carteiras de Trabalho dos empregados estavam no Sindicato dos Produtores Rurais de Pirassununga, o que configura retenção de documentos, uma das características do trabalho em condições análogas à de escravidão previstas no art. 149 do Código Penal.

Os auditores fiscais e procuradores do Trabalho também encontraram recibos assinados no valor de um salário mínimo no Estado de São Paulo (R$ 690), apesar de, segundo o MPT, os trabalhadores não terem recebido nada.

Os contratos de trabalho estavam em nome do produtor André Hayata, filho de Shigueo; seu outro filho, Hélio Hayata, era o gestor da produção.
A fiscalização encontrou ainda rescisões de contrato de trabalho também irregulares, referentes a outro grupo de 15 trabalhadores que trabalhou para a família Hayata na plantação de tomate no Sítio Araúna, em Analândia (SP). "As rescisões estavam assinadas, porém não haviam sido pagas, conforme apuramos", explicou o procurador Nei Vieira.

Aliciamento e condições de trabalho
As famílias encontradas em situação análoga à de escravidão em Pirassununga foram aliciadas nos municípios mineiros de Taiobeiras e Salinas com promessas de bons salários. "O empregador iludia as vítimas, dizendo que receberiam no final da safra valores de até R$ 15 mil", afirma Nei. Seriam descontados do pagamento – que nunca chegou a vir – as despesas com a viagem de ida e os adiantamentos usados para comprar alimentos no mercado indicado pelo empregador. Sem salário, os trabalhadores ficavam sem condições de voltar às suas cidades.

Os empregados da colheita e suas famílias dormiam em um abrigo feito de material compensado, produzido com caixas recicladas de leite longa vida. Os quartos eram abertos. A fossa séptica ficava a seis metros da moradia, quando o espaçamento determinado pelas normas deve ser de, no mínimo, 30 metros. Havia vazamentos e a tampa da estrutura estava ruindo.
Não havia na propriedade, ainda, local adequado para a lavagem dos equipamentos de proteção individual (EPIs) utilizados na aplicação do agrotóxico, o que aumenta os riscos de contaminação do meio ambiente e dos trabalhadores. As máscaras de proteção, que não podem ficar próximas ao uniforme com veneno, eram lavadas junto com o restante do equipamento.
Após a fiscalização, o Ministério Público do Trabalho celebrou um TAC com Hélio, André e Shigueo Hayata, que se responsabilizaram pelo pagamento de aproximadamente R$ 15 mil líquidos para cada trabalhador, sendo R$ 5 mil de indenização por danos morais e R$ 10 mil referentes às verbas rescisórias. Os empregados receberam também as guias para sacar o seguro-desemprego. Eles voltaram para Minas Gerais na última terça-feira (11), com as despesas pagas pelos empregadores.

Os trabalhadores que prestaram serviços em Analândia e não receberam o pagamento de verbas rescisórias, conforme apurado pelo MPT, também devem receber o pagamento de verbas rescisórias e indenização de no mínimo R$ 15 mil.
Fonte: Repórter Brasil - 14/09/2012

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